quinta-feira, 20 de outubro de 2011

A vida é foda !


Um dia eu tive um sonho

Sonhei que estava deitado na cauda do dragão do tempo e fiz uma viagem anárquica
Acabei numa sala repleta de espelhos
Olhei-me num deles e vi meu coração, meu cérebro e meu umbigo numa forma de homem do avesso
Senti algo perto de um total desespero!

Pensei

Que diabo é isso meu Deus? Estou transverso!

E nisso uma saraivada de memórias arrebentaram meu corpo em mil e uma vozes, em 250.000 mil caretas, e em um milhão de relacionamentos

Vi enganos, possessões, medos
Certezas, alegrias, amor, dúvidas, falas e falas e mais falas, desejos
Forças, amizades, toques, beijos, beijos e mais beijos
Calças, costuras, dores, comidas, ecos, congestionamentos
Repostas, repostas, repostas, parafusos, cobertas, inconscientes adestramentos

Esquecimentos me julgaram
Julgamentos me constrangeram

Cartas eu lancei a sorte

E vi que nada está ao léu
Cada feito está dito no meu intento

Ouvi um retumbante estampido

E apareceu-me um velho tocando-me a cabeça e me dizendo:

Seja como for o que você sabe você sabe, mesmo fingindo esquecê-lo!

Acorde em vida, desengate o freio!


Acordei

E pensei

A vida é foda!

No fim fenece sem nos deixar nada
Nem a veste corpo perecível ao tempo
Fazendo-nos acreditar na morte

A vida é foda!

Porque tem uma aqui dentro, uma que é ai fora e uma outra que é um circuito problema que mistura aqui dentro com ai fora!

Isso é doído!

Quantas vezes a gente não se vê sentindo uma coisa, pensando outra e falando uma outra coisa ainda

Sentindo-se uma bosta, pensando que um dia tudo vai ser diferente e falando para quem quer que seja: eu sei o que estou fazendo!
Firmeza! Firmeza!

Doutras vezes vem acontecimentos sem espera, sem eira e nem beira
Sem o menor propósito nos colocam em pura calamidade

(Essa uma amiga me contou) 

Você atrasado para um compromisso muito importante e o pneu do seu carro fura, ai quando você vai ver o macaco está com problema, demora muito para você torcer os parafusos, passa uma pessoa e ri da sua cara, você vê no relógio e está muito atrasado, quando finalmente você vai trocar o pneu, o estepe está murcho, você senta na calçada e chora, depois você corre até o posto, corre pelas ruas empurrando um pneu, mais alguns riem da sua cara, você chega no posto te confundem com um borracheiro, você está ensopado de suor e graxa, troca o pneu, vai ao borracheiro, compra o um macaco novo e naquela noite entram no seu carro, um ladrão de macacos rouba o seu carro e todos outros do quarteirão inteiro!

Outro dia um suíço piloto de moto velocidade, venceu uma corrida e na volta da vitória bate num retardatário concorrente e na gravidade do acidente morre ali mesmo. Era sua primeira vitória!

Vai dizer?
A vida é foda!

Nem mais, nem menos, uma matemática incógnita
Às vezes reles como um percevejo
Outras, incrível, mágica e felizmente surpreendente

Outro dia conheci, numa ação servidora com um grupo de amigos, um morador de rua, o Seu Paulo, talvez 65 anos, ocupando uma praça na Vila Pompéia
Um homem sem casa, sem alegrias e fechado em sua vida constrangedora, por não ter o seu teto, por não se sentir diferente de um bueiro

Aparentemente ele precisava da gente, e em plena ação social, numa cantoria Nelson Gonçalviana nossa para ele
O homem comovido pede o violão e o pegando na mão
Dedilha uma baixaria chorona tocando a mesma música
Ela nos devolvendo
Arrebentando o coreto!

Nos deixando no chinelo
Nos comovendo para cachorro!

Nós é que precisávamos dele!
Para redimir nossas pequenas impressões acerca do que é ser ou não ser      

A vida é foda!

Tento acercá-la de um sentido
Encontrar-lhe o jeito
Entende-la

O que de fato percebo é que ela acontece numa sucessão maior que o tempo e o espaço
Ela é um monstro comovente
Que nos pede o corpo presente

Para poder vê-la em sua riqueza
Para poder abraçar-lhe inteira

Criar nossos livros de histórias
Cujas personagens e enredos são nossas vidas inteiras   

Essa poesia é dedicada a Seu Paulo e Dona Maria